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Do interesse pelos direitos humanos à coordenação do maior abrigo indígena da América Latina

Conheça a história da colaboradora Nadya Silveira, que construiu uma trajetória marcada pelo compromisso com a dignidade e a inclusão de migrantes e refugiados na AVSI Brasil.

Tayna Silva Marcelo

Quando Nádya Silveira deixou Bocaiuva para estudar Relações Internacionais na PUC Minas, em Belo Horizonte, não imaginava que sua trajetória a levaria a coordenar um dos espaços mais desafiadores e significativos da resposta humanitária no Brasil. Seu interesse por direitos humanos surgiu na universidade, no mesmo período que conheceu o trabalho da AVSI Brasil nas APACs de Minas Gerais.

Durante a pandemia, ao voltar para Bocaiuva, Nádya percebeu que sua vocação profissional ia além do trabalho acadêmico e que não queria se limitar a um escritório. Foi quando tomou uma decisão definitiva: atuar diretamente com quem mais precisava. “Eu sabia que era algo que eu queria explorar. Não queria estar só num computador, queria ir para o campo, aplicar o que eu estudava e viver na prática o que a gente sempre lê”, conta.

O despertar para a causa humanitária

O contexto de crise sanitária e o retorno para casa a fizeram refletir ainda mais sobre seu propósito de trabalhar com causas humanitárias. Foi então que cruzou novamente com a AVSI Brasil. “Eu ainda estava em Bocaiuva quando me inscrevi para a AVSI em São Paulo, em dezembro de 2022. Já conhecia o projeto de Roraima e tinha uma rede de apoio em São Paulo. Pensei: bom, vou tentar.”

A vaga era para assistente de campo em um projeto de acolhida para famílias em situação de vulnerabilidade social. Na época, o projeto, gerido pela AVSI Brasil, estava em fase de implementação. A candidatura deu certo e, em menos de uma semana, Nádya se mudou para São Paulo.

Lá, acompanhou desde o início a estruturação do projeto. Como uma das cinco primeiras colaboradoras contratadas, auxiliou na regulamentação, na documentação dos beneficiários e na organização dos espaços.

“São Paulo foi uma experiência que me ajudou a crescer muito. Comecei como assistente de campo, passei para assistente de registro e logística dos abrigos e, depois, assumi a supervisão de participação coletiva. Foram três funções dentro do mesmo projeto, cada uma me preparando para estar aqui em Roraima hoje.”

Em 2024, Nádya foi ainda mais longe. De Bocaiuva para São Paulo e, agora, para Pacaraima, em Roraima, na fronteira com a Venezuela. Lá, assumiu o cargo de Oficial de Proteção de Base Comunitária no abrigo Janokoida, voltado à população indígena venezuelana.-

O desafio de coordenar um abrigo indígena na fronteira

Atualmente, em Boa Vista, coordena a operação do maior abrigo indígena da América Latina. Inaugurado em março de 2022 e gerido pela AVSI Brasil, o abrigo Waraotuma a Tuaranoko integra o programa Gestão de Abrigos, desenvolvido pela AVSI em parceria com a Força-Tarefa Logística-Humanitária do Governo Federal, agências da ONU e organizações do terceiro setor desde 2018. Com capacidade para acolher até 1.500 pessoas de diferentes etnias, como Warao, Enepã, Kariña e Pemón, o espaço foi adaptado aos costumes indígenas da Venezuela, a fim de promover a integração social, cultural e o fortalecimento da identidade dos migrantes acolhidos.

A importância do acolhimento e do vínculo humano

No dia a dia do abrigo, Nadya acompanha de perto os desafios e as necessidades da população indígena migrante. Ela destaca que o primeiro acolhimento é um momento decisivo e que criar um ambiente seguro e tranquilo faz toda a diferença. Ao longo do trabalho, vivenciou situações que reforçam a importância do vínculo e do cuidado, como a chegada de um idoso venezuelano em situação de vulnerabilidade. Com o suporte da equipe, ele encontrou segurança e estabilidade no abrigo.

Lidar com os desafios de um abrigo indígena exige sensibilidade e respeito às especificidades culturais. O papel da equipe de acolhida é garantir segurança e criar um ambiente de confiança para os acolhidos. “Se o afeto e a criação de vínculos são o ponto central do nosso trabalho, não podemos deixá-los se perder em meio aos processos administrativos”, explica Nadya. Para ela, o trabalho humanitário vai além da assistência imediata: trata-se de fortalecer capacidades, garantir direitos, transmitir segurança e criar oportunidades reais de inclusão.

Sua trajetória na instituição não pode ser medida somente pelo tempo, mas pela vivência. Hoje, percebe sua evolução na forma de lidar com situações que, três anos atrás, não saberia enfrentar. Destaca ainda a importância das pessoas que cruzaram seu caminho, colegas e gestores. “Acho que, no final de tudo, somos frutos das pessoas que encontramos pelo caminho.”

A missão da AVSI Brasil e os próximos passos de Nádya

A atuação de Nádya reflete os princípios da AVSI Brasil, organização sem fins lucrativos que, desde 2007, promove o protagonismo de pessoas em situação de vulnerabilidade e emergência humanitária. Em 2024, a AVSI Brasil desenvolveu 48 projetos em diferentes frentes, impactando diretamente mais de 923 mil pessoas. A migração e o refúgio ocupam um papel central nessa atuação, reafirmando o compromisso com a construção de soluções para populações deslocadas.

Embora a rotina seja intensa, Nádya busca equilibrar vida pessoal e profissional. Aos poucos, explora Boa Vista, frequenta cafés e se conecta com novas experiências. Sobre o futuro, tem certeza de que quer continuar no campo humanitário, unindo prática, pesquisa e o desenvolvimento de novas estratégias de acolhimento.

“O abrigo Waraotuma a Tuaranoko, em Warao, significa ‘Lugar de Repouso’, e acredito que ele cumpre esse papel não apenas para quem chega, mas também para nós, que trabalhamos aqui, incluindo eu”, conta Nadya. Para quem deseja seguir um caminho semelhante, ela deixa um conselho: “Vá com medo, mas vá. Explore, dê uma chance a si e aos seus sonhos, porque ninguém mais fará isso por você.”