“Esta es la radio que trae la información justa y balanceada”, diz o locutor Erasmo Rangel. Ele, assim como outros dez refugiados e migrantes venezuelanos do abrigo Rondon 3, é criador de conteúdo para a rádio comunitária “La Voz de los Refugiados”, lançada no final de fevereiro, em Boa Vista, Roraima.
A rádio é um projeto de inclusão digital da Unidade de Inovação da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) financiado pelo Ministério de Cooperação de Luxemburgo e implementado pela AVSI Brasil. A inauguração do projeto foi realizada com a gravação ao vivo de uma mesa redonda entre voluntários da comunidade, ACNUR, AVSI e Operação Acolhida.
A estreia teve como temática principal o objetivo da rádio: a importância de refugiados e migrantes acessarem informação correta, de fontes seguras através de especialistas, principalmente em tempos de pandemia. Durante a mesa redonda, falou-se sobre os efeitos negativos das fake news e o importante papel que será desempenhado pelos voluntários da rádio para solucionar rumores e dúvidas nas suas comunidades.
“Esta é uma rádio comunitária, ou seja, uma rádio da comunidade para a comunidade. O grupo de voluntários da rádio tem um papel de extrema importância em promover a verdade e a conscientização sobre o compartilhamento de informações nos meios digitais, o que impacta as decisões e o futuro de refugiados e migrantes no Brasil”, diz Lucas Ferreira, assistente de comunicação do ACNUR Brasil.
A rotina dos voluntários da rádio consiste em consultar a comunidade ao seu redor para entender as principais necessidades de informação, desinformação e rumores que circulam dentro e fora dos abrigos. Assim como em uma rádio, o grupo se reúne semanalmente para pautar os temas que devem ser produzidos nos próximos dias. Para isso, o grupo assume papeis de criadores de roteiro, locutores e produtores.
As divulgações dos conteúdos de “La Voz de los Refugiados” são transmitidos em sistema de som analógico nos abrigos Rondon I, Rondon II e Rondon III durante as refeições. Esses são alguns dos abrigos para refugiados e migrantes da Operação Acolhida, resposta federal do governo brasileiro para crise venezuelana. Além disso, os podcasts e áudios dos programas são compartilhados pelo Whatsapp para atingir ainda mais pessoas dentro e fora dos abrigos.
“Falamos sobre leis trabalhistas, discriminação, documentação e vários outras temáticas. Mas o principal é identificar aquele erro de informação, aquela mentirinha que está circulando na comunidade e que pode acabar prejudicando alguém. Quando dizem, por exemplo, que um imigrante pode votar no Brasil, ou que a fronteira abriu, sem realmente estar aberta” conta Maria Andreina Gil, 35 anos, voluntária do projeto.
Capacitação
Para promover a autonomia na criação dos conteúdos, o projeto envolveu o grupo de rádio em uma capacitação de três módulos sobre radiojornalismo, verificação jornalísticas e técnicas de teatro jornal. Desta forma, os voluntários puderam propor desde o princípio diferentes roteiros de rádio em formato de podcast para tratar os temas de interesse da comunidade. Foram considerados a estética, linguagem e formato preferidos pelos voluntários.
“Esta rádio é de vocês refugiados e migrantes, a ideia é que vocês compartilhem estas informações e continuem buscando apurar a verdade e responder as preocupações de sua comunidade”, disse o chefe de escritório do ACNUR em Roraima, Oscar Sánchez Piñeiro, durante a cerimônia de inauguração.
“A todos que tiveram essa ideia e principalmente àqueles da comunidade que fazem esse trabalho: meus parabéns. Com todo o avanço da tecnologia, o rádio não morreu. É o instrumento mais democrático de comunicação. Nesses momentos difíceis que vivemos de informação, com as fake news, a rádio vem para trazer as informações justas e balanceadas”, diz Heli Mansur, gerente geral da AVSI em Roraima, durante sua participação na mesa redonda.
O Projeto
O projeto da rádio “La Voz de los Refugiados” foi apoiado pelo Governo de Luxemburgo, uma vez que se destaca por ser uma iniciativa inovadora de combate a rumores, e é liderada pela população refugiada e migrante em suas comunidades.
As equipes da AVSI Brasil e ACNUR realizaram, previamente à formação de um grupo de voluntários, um diagnóstico sobre desinformação nos abrigos de Boa Vista, Roraima. A pesquisa identificou que 28% dos entrevistados já haviam presenciado impactos negativos advindos da circulação de notícias falsas em sua comunidade, além das principais temáticas a serem abordadas.
Esses dados embasaram o desenvolvimento do projeto, que com o apoio da Operação Acolhida, teve as instalações do estúdio central em formato de Laboratório de Rádio no Abrigo Rondon III e instalação de sistema de áudio nos demais abrigos.
Atualmente, os beneficiários dos abrigos Rondon I, Rondon II e Rondon III podem escutar aos programas de rádio nas mais de 40 caixas de som distribuídas nos refeitórios. Nos próximos dias, o Abrigo Pricumã também será contemplado pela estrutura da rádio “La Voz de los Refugiados”.
A perspectiva de crescimento do projeto não termina por aí, um chatbot de Whastapp está sendo desenvolvido para facilitar a comunidade a ter acesso aos programas gravados pelos voluntários da rádio.