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Projeto “Superando Fronteiras” é lançado em Belo Horizonte

Financiado pela União Europeia, iniciativa é lançada oficialmente em evento realizado no auditório da Associação dos Magistrados Mineiros

Eu liderava uma gangue do meu bairro, me entreguei ao mundo do crime e sofri muito nos presídios tradicionais. Cada vez que saia de um presídio, voltava pior. Até que tive a chance de ir para a [unidade prisional] APAC e lá aprendi a ser um ser humano de bem. Hoje trabalho como inspetor de metodologia da FBAC e serei eternamente grato a todos que me acolheram por acreditarem em mim”, afirma Daniel Luiz da Silva, ex-recuperando da APAC de São João Del Rei (MG).

Para que mais vidas sejam recuperadas, como a de Daniel Luiz, foi criado o projeto Superando Fronteiras, que tem como objetivo contribuir para o fortalecimento da experiência das Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (APACs) em Minas Gerais e promover a expansão do método para os estados do Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Paraná e Rondônia.

O evento que lançou oficialmente o Superando Fronteiras ocorreu na última terça-feira (26), no auditório da Associação dos Magistrados Mineiros (AMAGIS) em Belo Horizonte (MG), com a presença de representantes da União Europeia, financiadora do projeto, e parceiros que desenvolvem a iniciativa: AVSI Brasil, Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados (FBAC) e Instituto Minas pela Paz.

É muito gratificante trabalhar para fortalecer a metodologia APAC, promover os direitos humanos no Brasil e ver a vida de famílias sendo mudadas pela atuação das APACs”, afirmou Jacopo Sabatiello, diretor vice-presidente da AVSI Brasil, na mesa de abertura do evento. 

Além dos parceiros, a cerimônia contou com a presença de autoridades do poder público de Minas Gerais, de representantes dos estados abrangidos, além de membros da sociedade civil e do setor privado, envolvidos com o tema da ressocialização de condenados.

O trabalho com as APACs, além de mudar a vida de tantas pessoas condenadas a pena privativa de liberdade, é capaz de mudar a vida de todos envolvidos e tornar todos uma pessoa melhor, inclusive juízes e promotores”, comentou Luiz Carlos dos Santos, juiz e ex-coordenador do Programa Novos Rumos que atua como voluntário na assessoria do projeto Superando Fronteiras.

Superando fronteiras

“Ao enviar pessoas para os presídios tradicionais, muitas vezes estamos as sujeitando a punições desumanas e saem de lá piores e cometem crimes ainda mais graves. Depois de tantos anos trabalhando na aplicação do direito penal, o método APAC se apresentou como uma solução para todos os problemas que enfrentamos no sistema carcerário. É uma esperança para a ressocialização de condenados”, afirmou Eiko Araki, Promotora de Justiça do Estado de Rondônia. “Foi muito difícil fazer que a gestão do meu estado aceitasse o método APAC, porém às vezes é preciso um pouco de loucura para ir contra o que todos acham que é normal para apostar em um método totalmente impensável”, complementou.

Eiko afirmou ainda que em Ji-Paraná, a segunda cidade mais populosa de Rondônia, com mais de 150 mil habitantes, as autoridades judiciais tinham muito receio em relação ao método APAC e após apresentação detalhada da AVSI e da FBAC, no II Seminário de Execução Penal, promovido pelo Ministério Público de Rondônia, no mês passado, o conceito se transformou e a metodologia está se tornando cada vez mais reconhecida.

Segundo o diretor executivo da FBAC, Valdeci Ferreira “os recursos provenientes deste projeto permitirão realizar uma série de ações para dar um salto de qualidade”, especialmente nos estados que buscam aprimorar suas intervenções para obter melhores índices de ressocialização e redução da reincidência criminal.

A expectativa é que o resultado gerado no projeto possibilite a ampliação da experiência e da metodologia como política pública no Brasil, reforçando a defesa dos direitos humanos e fortalecendo a participação política e o envolvimento da sociedade civil.

Programação

A mesa de abertura foi composta por Antônio Armando Anjos, secretário de Defesa Social de Minas Gerais, Jarbas Ladeira Filho, desembargador e coordenador do Programa Novos Rumos do TJMG, Asier Santillan, adido de cooperação da União Europeia, Maurício Torres Soares, presidente Associação dos Magistrados Mineiros, Durval Angelo, deputado estadual e vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Valma Leite da Cunha, promotora de justiça do Ministério Público de Minas Gerais, Valdeci Ferreira, diretor executivo da FBAC, Jacopo Sabatiello, diretor vice-presidente da AVSI Brasil, Luíz Carlos Rezende e Santos, juiz de direito do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e Maurilio Pedrosa, gestor do Instituto Minas Pela Paz.

O painel que refletiu a importância da expansão das APACs a nível nacional foi formado pelas entidades parceiras do projeto (AVSI Brasil, Minas Pela Paz e FBAC) e pelo juiz Luiz Carlos dos Santos.

Já o encerramento foi composto por representantes dos estados que estão em fase de implantação de APACs: Aline Miranda, defensora pública e assessora especial da Secretaria de Justiça do estado do Ceará, Murilo Oliveira, secretário de Administração Penitenciária do Estado do Maranhão, e Eiko Araki, promotora de justiça do Estado de Rondônia.

Os participantes explicitaram os passos já dados em seus estados rumo à implantação da metodologia APAC e refletiram sobre as respectivas e condições para seus estados.

Sobre as APACs

As unidades prisionais APAC tratam-se de presídios diferenciados pela promoção da dignidade da pessoa. A proposta consiste na realização de um percurso de ressocialização de condenados.

Essas unidades são caracterizadas pela ausência da polícia e de armas dentro da estrutura penitenciária, contando com a presença de funcionários civis e voluntários da sociedade para realizar as atividades. Outro diferencial está no custo de manutenção. Segundo dados do Ministério Público, uma APAC se mantém com um terço do recurso necessário para manter um presídio tradicional.

A quantidade de reclusos nas APACs ainda não atinge 2% da população carcerária de todo o país e a sua expansão poderá possibilitar o alcance de maior número de condenados que cumprem pena nos estabelecimentos prisionais, reforçando a defesa dos direitos humanos.

*Fotos: Bruno Senna