Por conta da violência no bairro onde morava, Rosimeire Maciel Santos, 54 anos, decidiu sair de casa e alugar uma quitinete em um bairro próximo para morar com seu filho, Adson Maciel, de 11 anos. Quando as fortes chuvas que alagaram várias cidades do Sul da Bahia, em dezembro de 2021, atingiram Itabuna, tanto a sua casa própria no bairro do Gogó da Ema, quanto o imóvel alugado, no bairro Jaçanã, foram afetados. “A água veio de todos os lados. Tem um rio próximo, então quando ele encheu, transbordou a água. Nós perdemos tudo, mas graças a Deus, temos saúde”, lamentou Rosimeire, que foi uma das 856.917 pessoas atingidas pelas enchentes que deixaram 163 municípios em situação de emergência na Bahia. De acordo com a Superintendência de Proteção e Defesa Civil da Bahia, 26 pessoas morreram e 520 ficaram feridas.
Quando a casa começou a encher de água, no meio da madrugada, Adson estava dormindo no cômodo alugado por sua mãe, cujo pagamento era possível graças ao benefício do Bolsa-Família, um programa governamental de transferência de renda para famílias em situação extrema pobreza. “Quando minha mãe me acordou, a casa já estava alagada. Ela me carregou da cama e me colocou em cima da escada para eu não pisar na água”, relembrou Adson, explicando que o volume de água dava para cobrir todo o seu pé. Enquanto a água não descia, Adson e sua mãe precisaram ficar dois dias no andar de cima da casa alugada, dividindo os aposentos com a dona do imóvel. No retorno para o andar térreo, onde moravam, viram os estragos. “A casa ficou com muita lama, tivemos que lavar. A água suja acabou com tudo. Minhas coisas tive que jogar tudo no mato”, confessou Rosimeire.
Em sua casa própria no Gogó da Ema, a situação foi ainda pior. “A água foi até o meio da casa, a tempestade arrancou até as telhas”, disse Rosimeire, reforçando que acabou perdendo a cama, a geladeira e o guarda-roupas por conta das enchentes. Como parte das ações de assistência às populações afetadas pelas enchentes, ela foi contemplada com um auxílio aluguel, além da doação de uma cama e uma geladeira. No entanto, mais de seis meses após o ocorrido, a vida ainda não é a mesma. “Minha vida ainda não voltou ao normal. Infelizmente o guarda-roupas ainda não tenho, mas com fé em Deus eu vou ajustar. Estamos ajustando a casa para sair do aluguel e retornar”, garantiu.
Espaço Ser Criança
Para uma mãe solteira, que atua no mercado de trabalho informal e tem um filho de 11 anos, tentar refazer sozinha tudo que perdeu após as enchentes não é tarefa fácil. “Eu sou pai e mãe. O pai dele faleceu há nove anos. Sou eu, Deus e meu filho”, conta Rosimeire. A situação se torna ainda mais difícil quando uma emergência climática deste porte acontece em um momento de pandemia, em que as escolas públicas da cidade já estavam há quase dois anos sem aulas.
Para apoiar as famílias atingidas pelas chuvas, a AVSI Brasil, em parceria com o Center for Disaster Phlatrophy (CDP) e o Lar Fabiano de Cristo, estabeleceu o Espaço Ser Criança, em Itabuna-BA. Lá, meninos e meninas encontram um espaço seguro onde são acolhidos e podem brincar com tranquilidade enquanto seus familiares tentam se recuperar da catástrofe. Com o apoio de educadores, crianças e adolescentes de 6 a 14 anos têm acesso a um espaço de convivência e aulas de capoeira. Uma sala foi revitalizada para atividades educativas e o parque infantil foi reformado para garantir as atividades ao ar livre.
Desde que ficou sabendo do Espaço Ser Criança, Adson não perde uma aula de capoeira. “Como as escolas estavam fechadas, minha mãe me levava para o trabalho dela. Eu ficava o dia todo lá sentado, jogando no celular, enquanto ela fazia faxina. Agora eu fico aqui para brincar, fazer amizades e aprender coisas novas”, explicou o garoto, que adora brincar de Capitão do Mar e Pega-Pega. “Aqui a gente aprende. Eu mesmo não sabia que existia o Dia do Capoeirista”, completa. Para sua mãe, o projeto trouxe o alívio de poder deixar o filho em segurança, enquanto trabalha para recuperar o que perdeu. “Esse projeto foi o melhor que já vi na vida. Se eu não pudesse deixar ele lá, ele teria que ir comigo para a faxina. Lá tem capoeira, a convivência com outras crianças, é como se fosse uma escola. Ele chega em casa muito feliz”, celebra Rosimeire, que também recebeu do projeto kits de higiene contendo sabão em pó, detergente líquido, sabão em barra, pasta de dente, papel higiênico, desinfetante, álcool em gel e sabonete.
O Espaço Ser Criança tem como objetivo oferecer um espaço seguro para 120 crianças e adolescentes de 6 a 14 anos, e suas famílias, com a oferta de atividades socioeducativas, além de apoiá-las com encaminhamentos para a rede de assistência social do município.