Quase 35 milhões de pessoas não têm acesso a serviços de água tratada, sendo 5,5 milhões apenas nas maiores cidades do país. Esses são os números divulgados pelo Instituto Trata Brasil, que divulgou o ranking de saneamento e analisou dados das 100 maiores cidades brasileiras e do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), no Dia Mundial da Água em 2021, celebrado em 22 de março.
Outro dado revela que aproximadamente 100 milhões de brasileiros não contam com acesso à coleta de esgoto (21,7 milhões nas 100 maiores cidades do país). O Brasil ainda não trata metade dos esgotos que gera (49%), o que representa jogar na natureza, todos os dias, 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento.
Dois exemplos de tecnologias sociais que minimizam os impactos da escassez de água no Semiárido brasileiro são o Sistema de Bioágua Familiar e o Aqualuz. O Sistema Bioágua Familiar – desenvolvido pelo projeto Dom Hélder Câmara e parceiros – é uma tecnologia de reutilização de águas que provém de atividades domésticas, que passam por tratamento em um filtro subterrâneo e segue para o armazenamento em um reservatório para ser utilizada na irrigação da produção de alimentos em quintais agroecológicos.
Já o sistema Aqualuz – criado pela startup SDW – purifica a água e retira os microrganismos, evitando doenças e garantindo água potável para o consumo humano. Ele potabiliza a água de cisterna através da radiação solar, permitindo que o indivíduo possa consumir a água diretamente do equipamento que faz o tratamento.
Projetos contemplados pelos sistemas
O agricultor Edelvan Santos sofria com a falta d’água na comunidade em que mora, na Bahia. “Antes a gente chegava cansado da roça e ainda tinha que carregar água. Hoje a vida ficou muito mais fácil com essa cisterna, temos água limpa por mais tempo. Também aprendemos o passo a passo de como fazer uma cisterna, como cuidar da água e manter ela limpa”, diz.
Edelvan é um dos beneficiários do projeto social Economia circular: Cisternas para o Semiárido, desenvolvido pela organização AVSI Brasil e parceiros. O projeto, que utiliza a tecnologia da bioágua familiar, construiu 35 cisternas em quatro povoados da região de Morro de Chapéu (BA), beneficiando famílias residentes na zona rural, nas comunidades de Alecrim, Santa Cruz, Lagoinha e Espinheiro I.
Outro programa desenvolvido no estado e que está mudando a vida dos baianos é o Semiárido Sustentável. Realizado em comunidades vulneráveis em Juazeiro (BA), o projeto social tem como objetivo amenizar a escassez de água com a implantação de tecnologias sociais que favoreçam: o acesso a água para consumo e produção (cisternas e bioágua); a conservação do meio ambiente (fossa ecológica); ações educativas de uso consciente da água em escolas municipais; e investimento na produção local com o apoio a grupos produtivos da região e a implementação de quintais produtivos.
A localidade em que o projeto é desenvolvido é conhecida como região do Salitre, em referência a um rio que faz a divisão do território. O rio era perene, mas com o uso inadequado foi ficando intermitente (em alguns períodos, o leito seca). A região fica no Semiárido e sofre com a escassez de água, além da ausência de saneamento básico.
Mas a implementação do sistema de Bioágua Familiar vai muito além. Ele viabilizou a produção agrícola no Semiárido durante todo o ano, em Pernambuco. Assim surgiu a Associação Quintal Verde, formada por agricultores participantes do projeto social Jucati Sustentável, com o objetivo de atrair novos parceiros e financiadores de outras regiões, bem como estimular e fortalecer o trabalho de produção agroecológica e a comercialização de insumos.
O projeto Jucati Sustentável implementou 52 sistemas de bioágua e sete cisternas foram instaladas, permitindo o cultivo de até 42 produtos diferentes nos quintais agroecológicos. Assim, além da produção de insumos para consumo próprio, os agricultores passaram a vender os produtos excedentes na feira local, no município de Jucati (PE). Antes, as famílias viviam de auxílios governamentais (cerca de 300 reais mensais). Depois da implantação da tecnologia, passaram a contar com cerca de um salário mínimo, fruto do trabalho nos próprios quintais produtivos. Saindo de Pernambuco e chegando no Rio Grande do Norte, é possível encontrar o programa social Viva Sabiá, que utiliza o sistema Aqualuz. A iniciativa – desenvolvida com parceiros – surgiu para dialogar com moradores dos municípios de Upanema, Governador Dix-Sept Rosado e Caraúbas, tendo como um de seus eixos o desenvolvimento e melhoria do acesso à água. Com foco na responsabilidade social e sustentabilidade, o programa inclui a implementação de sistemas de potabilização da água por meio da irradiação.
Quem aprovou a implementação foi a beneficiária Vera Lúcia. “A equipe foi de casa em casa ensinando, depois vieram fazer demonstração de como o Aqualuz deve ser utilizado. E com certeza iremos usar por muito tempo. É fácil de usar, e a durabilidade é de 20 anos. Fica para nós e para os nossos filhos. Água é saúde! E é isso que o programa oferece. Queria agradecer a toda a equipe pelo projeto e acompanhamento”, relata.
Também são desenvolvidas dentro do projeto as oficinas de educação socioambiental para uso e consumo de água e estudos sobre a importância do acesso à água potável e saneamento. Está previsto também a avaliação qualitativa da água antes e depois do tratamento com o Aqualuz.